Pode ser que você não perceba mas muito mais que ingerir alimentos, aquilo que alimenta também é capaz de causar emoções, promover aprendizado social, despertar memórias e pertencimentos.
Os hábitos alimentares são condutores emocionais, a comida e o ato de comer são centrais no aprendizado social por serem atividades vitais e essenciais, embora seja parte da nossa rotina e passe desapercebido. As atitudes em relação à comida são aprendidas desde cedo e é sempre uma experiência capaz de marcar nossa vivência mesmo que nós não sejamos capazes de lembrar cada detalhe. Esse comportamento alimentar é nutrido pelos adultos afetivamente e conferem um poder sentimental duradouro ao hábito de comer. Dessa forma, o lugar onde crescemos e as pessoas com quem convivemos vão aos poucos construindo um material cultural. Esse material dá forma ao nosso comportamento alimentar que se liga diretamente ao sentido de nós mesmos e à nossa identidade social. A maneira como nos alimentamos revela constantemente a cultura na qual estamos inseridos.
Ao longo da vida os hábitos alimentares podem mudar completamente, e essa mudança revela as várias importâncias do comer. Nosso comportamento em relação à alimentação pode ser ao mesmo tempo nosso hábito mais flexível possível e o mais arraigado de todos os costumes. As mudanças no gosto e nas preferências de cada pessoa, a memória e o peso do primeiro aprendizado alimentar, e algumas das formas sociais aprendidas, talvez permaneçam para sempre em nossa consciência.
Estudos atribuem ao olfato e paladar o poder de relembrar o passado. Em busca de um tempo que já passou dedicamos à comida o resgate de algumas memórias da infância, por exemplo. Essa experiência marca nossas vidas de maneira resistente, pois ela é capaz de nos trazer impulso para nos conectarmos com aspectos da nossa personalidade que estavam no fundo da nossa memória.
Ao trazer essas experiências para o contexto da divulgação de informações sobre alimentação e da Educação Alimentar e Nutricional, devemos nos lembrar que as experiências se repetem permanentemente, em diferentes cenários culturais. Esse adulto, responsável por transmitir uma cultura comestível, pode ser representado por diversas pessoas dentro da sociedade, como a família (pai, mãe, avós e tias); merendeiras; cozinheiros; e nutricionistas.
No ponto de encontro entre os temas de alimentação e educação, as ideias do sociólogo Carlo Petrini, fundador da associação Slow Food, sustenta que o aprendizado deve ser saboroso e com corpo inteiro, não apenas com o intelecto. No documento Manifesto pela Educação (SLOW FOOD, 2010), vamos destacar alguns princípios sobre experiência do comer, e que pode servir de inspiração para colocar em prática o sabor do conhecimento pela comida.
Para o Slow Food, a educação “é um caminho íntimo, que envolve a dimensão cognitiva, experiencial, afetiva e emocional; alimenta-se do contexto no qual se encontra, valorizando memória, saberes e culturas locais; desenvolve a consciência de si mesmo, do próprio papel e das próprias ações; e promove mudanças, gerando pensamentos e comportamentos novos e mais responsáveis”. O educador Paulo Freire também sugere que não se deve separar o cognitivo do emocional no aprendizado: “estudamos, aprendemos, ensinamos e conhecemos (…) com o nosso corpo inteiro. Com os sentimentos, com as emoções, com os desejos, com os medos, com as dúvidas, com a paixão e com a razão. Colocados todos esses pontos numa mesma mesa, por assim dizer podemos concluir que a centralidade da alimentação para cada um de nós e a sociedade está ligada aos sentimentos que nos alimentam e são capazes de acessar a realidade e, por vezes, transformá-la.